Neste domingo (11) aconteceu em diversas cidades do Brasil uma manifestação chamada “Marcha da família cristã pela liberdade”. A proposta era a de uma manifestação popular em defesa dos valores cristãos, o que se viu foi mais uma manifestação pró-Bolsonaro. Vou poupar o leitor de divagações e rodeios em torno do tema, serei sucinto.

O momento para o governo é terrível, conforme temos avisado em diversas plataformas — podcasts, vídeos, aulas, palestras, artigos — e há mais de um ano, o governo Bolsonaro se colocou em uma situação de divisão de poderes que o tornou sócio minoritário do Palácio do Planalto. Sentindo que o cargo de Presidente da República está por um fio, Jair Bolsonaro volta a buscar os ombros da população assim como fez em 2018, quando foi levado dos saguões dos aeroportos para a Presidência do País.

Acontece que agora não é Jair Bolsonaro o agente motivador das manifestações de rua e sim pessoas que almejam a aprovação eleitoral nas urnas no ano que vem, momento em que concorrerão aos cargos de deputado estadual ou federal. Por incrível que pareça — e a mim parece bastante –, em meio ao pandemônio que se tornou a política em Brasília, ainda há pessoas com vontade de vivê-la, de entrar no olho desse furacão, ou melhor, entrar no centrão desse furacão.

Sendo o maior problema do governo Bolsonaro o fato de o Brasil não ter uma base de sustentação para o pensamento de Direita (o que acarreta em uma realidade onde a máquina pública federal, estadual e municipal é tomada por militantes de esquerda), essas pessoas que hoje estão nas ruas com faixas declarando apoio a Jair Bolsonaro, esperam chegar no Congresso e fazer o que? Aquilo que o Bolsonaro não fez? Fazer o que os deputados da base do governo não fizeram nesses mais de dois anos de mandato? Certamente que não, afinal se forem questionados quanto à capacidade dos deputados da base bolsonarista, declararão aprovação inconteste.

O que move as manifestações não apenas hoje, mas as move desde o primeiro semestre de 2020, é a transformação das ruas em base de lançamento de candidaturas para o Legislativo. Não tendo o Brasil uma base intelectual conservadora, o grupo que se dispõe nas urnas para representar o pensamento conservador — o qual ninguém nas ruas tem ideia sólida do que seja — adere à pauta “Jair Bolsonaro”. Sim, como esclarecido por João Camilo de Oliveira Torres, “[…]o melhor regime político para a América Latina será o que tenha na chefia do Estado a imagem do pai”; não apenas o Presidente se torna o pai como se torna a pauta, a razão de existir, o mote pelo qual se vive civicamente no Brasil. Se em Roma, viver na civitas era a exigência para a composição do grupo civilizacional, no Brasil é a adesão ao Governo da vez que torna o eleitor verdadeiramente brasileiro.

“Não existe conservadorismo no Brasil, existe bolsonarismo“, posso eu parafrasear aqui o professor Olavo de Carvalho. Quando um grupo vai às ruas se identificando como “marcha de cristãos”, o que temos na verdade é uma “marcha bolsonarista”, pois na leitura desse grupo avesso à leitura, defender a família é uma ação inclusa na defesa de Jair Bolsonaro, pois como diz o jargão criado pelo próprio Presidente “ou você quer a volta do PT?”. Se o PT voltar, seremos obrigados a nos vacinar; proibidos de celebrar culto a Jesus Cristo; perderemos nossa liberdade individual e tantas outras desgraças que já são realidade na vida de todo brasileiro, mesmo vivendo um governo militar com Bolsonaro no poder (que é o que efetivamente temos hoje).

Assim, escrevo para registrar algo que se faz presente na obra de Fiódor Dostoiévski (e em todo o realismo russo): o Brasil não vive hoje, como a Rússia não viveu na primeira metade do séc. XIX, o momento de tomada de poder, mas de estruturação do corpo conservador. Todas essas pessoas que estão nas ruas buscando a formação de base eleitoral para a candidatura no ano que vem, estão metendo os pés pelas mãos. Não tendo o Brasil uma estrutura conservadora, chegando ao poder farão o que? Eu mesmo respondo: se unirão ao centrão. Por falta de virtude (como fez mais da metade da base do PSL) ou por força do atual sistema político (como fez o próprio Jair Bolsonaro).

Finalizo reafirmando, não se enganem, não é hora de tomar o poder, mas sim de preparar o que futuramente pode vir a ser uma tomada de poder, isso se conseguirmos concluir essa fase de estudo e estruturação. Se não conseguirmos, iremos compor apenas o grupo que faz do Brasil “o pais do futuro”, e nunca o país do presente. Entrar no poder político hoje é fortalecer o centro, única força política existente no Brasil após “A queda de Jair Bolsonaro”*.


*A Queda de Jair Bolsonaro, mais conhecida como “acabou, porra!”.

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